sexta-feira, 25 de maio de 2012

EU FUI - EU SOU



Quero-quero
 
Não sou cantor, não sou nada.
Estou aqui de passagem,
já chegando ao fim da viagem
com o peso da cangalha
e a melena já grisalha.
Na goela, a voz cansada;
Na face, sulcos de terra arada;
No peito, a dor da saudade,
canto sem sonoridade,
e a espinha já bem arcada.

Na lonjura de um cafundó,
numa encruzilhada da vida,
lá ficou, na despedida,
sob a ramada frondosa,
uma silhueta dengosa
e a lembrança amargurada,
quando ali de madrugada,
entre abraços e arquejos,
entre resmungos e beijos,
para sempre enraizada.

Da vida nada se leva,
mas ainda se faz mister
que entre o homem e a mulher,
do início até o final,
vindo de um mesmo caudal,
e é por certo relevante
até mesmo se distante,
na dor ou no prazer,
é necessário aceder
que o amor é importante.

Sou filho, pai e avô,
do mundo nada mais quero,
sou grito de quero-quero,
fui clarim, fui regimento,
tapera e acampamento.
Noite clara, noite escura,
nada mais que criatura,
sanga funda, boitatá,
sou flor de caraguatá,
sou pôr de sol na lonjura.

Embora não sendo cantor,
sou crente da poesia,
considero uma heresia
não dar valor a quem canta.
O timbre da voz na garganta,
por mais que seja indeciso,
sendo o verso de improviso,
a todos tiro o chapéu
e, até chegar no céu,
eu canto porque preciso.

Porto Alegre-RS, 29 de abril de 2012.

Ivo Leão da Rocha

Caraguatá

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